Joana de Valois: A santa que era feia

Santa Joana de Valois
Foto: http://pt.wikipedia.org

Tenho uma dúvida que nunca consegui entender inteiramente: que influência a beleza física das pessoas tem nos juízos que se fazem delas?

Um homem bem apessoado, e sobretudo uma mulher, tem meio caminho andado para nos sentirmos atraídos e apreciarmos as suas ações com benevolência.

Sabemos que valorizada retamente, a beleza é secundária e transitória, e no entanto, muitas vezes acaba tornando-se decisiva no decorrer de muitas vidas.

Confúcio dizia: “Ainda não encontrei alguém que prezasse tanto a virtude como preza a beleza física”. Temos de aceitar que na prática esta afirmação é verdadeira.

Em teoria, todos concordam que devemos analisar as pessoas pela qualidade das suas almas, pelo valor das suas ações, pelo calibre da sua inteligência. Mas no fim das contas, percebemos que, na realidade, consideramos tudo isso, o espírito e o coração, como parentes pobres da beleza.

Conforme dizia Tolstoi, “é uma ilusão acreditar que a beleza física é o reflexo da virtude, do amor, da bondade”, mas caímos nessa ilusão todos os dias, com injustiça para com as pessoas feias.

E se formos sinceros, também sabemos que enquanto o feio ou a feia têm que demonstrar a qualidade das suas almas, a pessoa bonita não precisa tanto desse trabalho.

 É possível que depois nos desiludamos e aí reconheceremos o vazio da beleza, mas o primeiro juízo já foi feito.  E se o bonito acaba por ser também bom, pensaremos como Virgílio, que “até a virtude parece mais atraente numa pessoa bonita”.

Tudo isto por que é assim? Por que damos tanto valor àquilo que não o tem? E acima de tudo, por que tornamos a vida tão difícil a essa pessoa que não tem qualquer culpa na sua fealdade?

Todos estes pensamentos ocorreram-me ao ler a vida de Santa Joana de Valois, a santa que era feia, embora filha, irmã e esposa de reis da França.

É que até na santidade damos valor decisivo à beleza física e gostamos de ver os santos nos altares, bonitinhos.  Se o foram em vida, que o sejam também no altar, é claro.  Se não o foram, o escultor ou o pintor encarregam-se de lhes dar o que lhes faltou em vida.

Mas tudo foi mais difícil nesta Santa Joana, feia, sardenta e aleijada, cuja santidade tanto teve a ver com a sua fealdade, e cuja vida passou-a no desprezo pelas suas nulas qualidades físicas.

Em 1464, a rainha de França, Carlota de Saboia, esposa de Luís XI, esperava o nascimento do seu segundo filho.  O rei e toda a corte desejavam um menino, depois da primogênita Ana. Mas nasceu outra menina, e alem disso, feiíssima de rosto e disforme de corpo por causa de um desvio no quadril, que aumentou durante toda a vida.

O seu pai, o rei, contrariado, nem quis que a pequerrucha morasse no palácio real, e mandou que a retirassem da corte e a levassem para o castelo de Linieres, em Berry.   A pequena ali cresceu e viveu reclusa, sem ter conhecido de perto o pai e a mãe. Sofreu muitas humilhações por parte de sua família, especialmente do pai que chegava a odiá-la por ser quase anã, enfermiça e aleijada.

Foi educada por guardiães (superiora de convento) desse castelo distante, sem conforto, em intensa solidão, e por conta disso consagrou-se tanto e tão cedo a Deus Nosso Senhor e a Virgem Maria. Os mistérios da Anunciação e da Encarnação, como rezamos no Angelus, eram as suas devoções.

Um dia, o rei seu pai casualmente passou por Linieres para alguma caçada, comentou maldosamente com o senhor do castelo que não sabia por que acontecimento esperava para matar essa filha indesejada que lhe nascera, em vez de um varão.

Os anos vão passando, até que ela se torna uma peça útil para uma política de Luís XI. Sendo Joana ainda criança de 12 anos, o pai acertou o casamento dela com o primo e herdeiro do trono, Luís de Orleans, filho do duque Carlos de Orleans, com quem lhe convinha emparentar. Foi em 1476.

Quando Luís de Orleans, o suposto marido, conhece a deformidade da sua prometida, não quis saber dela para nada. E quando, forçado, aceita o casamento, nem sequer olha para a esposa durante a cerimônia e abandona-a num calvário de uma nova e mais grave solidão. Além de odiá-la, ele a humilhava em público.

Joana, ao contrário, ama sincera e ternamente o marido que a tortura com seu desprezo. E ela vai defendê-lo em juízo quando cair em desgraça, for encarcerado e condenado à morte pelo primo, o novo Rei Carlos VIII.

Mas o agradecimento de Luís, quando anos mais tarde subiu ao trono por morte de Carlos VIII, seu cunhado e irmão de Joana, alegando um casamento forçado, por falta de consentimento e jamais ter sido consumado, foi obter a nulidade em Roma em 1498. E assim deixa Joana sem ser solteira, nem casada, nem viúva. Seria perfeitamente compreensível que ela estivesse a ponto de se desesperar.

Foi feita Duquesa de Berry, recebendo a província para governar. Indo viver em Bourges, sua capital, Joana cumpriu seus deveres e se devotou ao bem estar dos súditos.

Mas, conforme ela mesma disse, “nesse momento Deus concedeu-me a graça de compreender que Ele, em sua Providência, assim o permitia, para que eu fizesse algum bem às almas.  E agora, sem estar  sujeita a homem nenhum, posso fazê-lo plenamente”.

Esse grande bem foi a fundação da Ordem da Anunciação em 1500, juntamente com seu diretor espiritual, o franciscano Gilbert Nicolas. Ordem de oração e penitência, cuja regra principal era a imitação das virtudes de Nossa Senhora narradas no Evangelho, com que vinha sonhando desde pequena.  Assim, fez os votos, deixou a aliança de casamento e vestiu o hábito, adotando o nome de Irmã Joana Mariana. Nela foi um exemplo de virtude e já em vida era considerada santa.

Mesmo com a saúde precária, penitenciava-se todos os dias e dedicava muitas horas à oração. Rezava incessantemente pelas almas do pai, do irmão e do marido. E deixou como orientação à Ordem rezar por eles.

Faleceu em Bourges a 4 de Fevereiro de 1505, aos 40 anos. Foi beatificada por Bento XIV em 1742 e canonizada por Pio XII em 1950.

É preciso dar graças a Deus de que, pelo menos no campo da santidade, não se cometa a injustiça de supervalorização da beleza física; e de que, ao menos Ele, não liga para corpos desajeitados, mas sim para almas luminosas.

José Luís M. Descalzo (em “Razões para viver”)

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