Artigo publicado no jornal Alagoas em Tempo, edição de 22 a 28 de junho/2015 | Ano 9 – Nº 685.
Marcos Antonio Fiorito *
“Errar é humano”, diz o provérbio. Porém, parcela dos anjos também errou e continuará errante por toda a eternidade. Nas últimas edições dedicamos nossa pena a escrever sobre o pecado original, suas consequências e o papel dele no sofrimento humano. Hoje nos debruçamos a tratar a respeito do pecado que condenou parte da corte angélica à condenação perpétua.
Ensina a doutrina cristã que os anjos diferem drasticamente da natureza humana: possuem uma inteligência não racional, puramente intuitiva e muito superior à nossa. A inteligência angélica não percorre etapas de raciocínio que a leva concluir determinada coisa. Basta aos anjos olhar para um determinado objeto para penetrar-lhe e conhecer sua essência.
Não possuem matéria, são dotados de puro espírito, permitindo-lhes deslocar-se para qualquer parte do universo com a velocidade do pensamento.
Poderíamos, ainda, tratar de outros atributos marcantes da natureza angélica, entretanto não caberia no espaço de um simples artigo. Queremos, sobretudo, discorrer a respeito da causa que levou Lúcifer e seus sequazes à condenação, conforme as palavras de Cristo: — “Retirai-vos de mim, malditos! Ide para o fogo eterno destinado ao demônio e aos seus anjos” (Mt 25, 41).
A Bíblia e a Tradição cristã não nos transmitiram muitos elementos a respeito do pecado dos anjos que habitam o mundo das trevas. E os teólogos divergem um tanto a respeito, porém são unânimes em reconhecer que o pecado foi de soberba e revolta à vontade divina. Outra formulação muito usada pelos autores cristãos é que houve uma “resistência à graça de Deus”.
Crê-se que Lúcifer foi um dos mais elevados anjos. O nome Lúcifer, justamente, significa “aquele que porta a luz”. Existe uma hierarquia muito grande entre os coros angélicos, tornando a diferença entre eles significativa. Um anjo imediatamente acima conhece e entende mais que o anjo imediatamente abaixo. E a forma de um anjo inferior “aprender” com o superior é através da iluminação de seu intelecto. Por onde podemos concluir que Lúcifer, que possuía elevado grau de conhecimento, iluminava a inteligência de inúmeros anjos, e estes, por conseguinte, prestavam-lhe especial admiração; deixando-se influenciar por ele.
“Eras um querubim protetor sobre a montanha santa de Deus (…) Foste irrepreensível em teu proceder desde o dia em que foste criado, até que a iniquidade apareceu em ti” (Ez 28, 14). Verdadeiramente Satanás deixou-se envaidecer, e de tal maneira, que não aceitou sua condição de mera criatura. Por isso diz as Sagradas Escrituras:
Tu dizias: Escalarei os céus e erigirei meu trono acima das estrelas. (…) Subirei sobre as nuvens mais altas e me tornarei igual ao Altíssimo (Is 14, 13-14).
Mas o que teria levado Lúcifer a desafiar o Criador? Uma das hipóteses mais consideradas pelos teólogos e doutores a respeito é que Deus teria revelado aos anjos, como forma de provar a fidelidade deles, que Ele criaria a raça humana e que a segunda Pessoa da Santíssima Trindade, Deus Filho, se encarnaria e, misteriosamente, somaria à Sua natureza Divina a débil natureza humana. Sendo assim, eles, anjos, deveriam obediência e amor absoluto a Jesus Cristo, que embora fosse verdadeiramente Deus, também seria verdadeiramente homem.
Ao passo que Lúcifer e seus asseclas se revoltaram, outro anjo tomou-se de brio e defendeu com impetuosidade a causa divina. Nascia assim o partido do bem: “Houve uma batalha no céu. Miguel e seus anjos tiveram de combater o Dragão. O Dragão e seus anjos travaram combate, mas não prevaleceram. E já não houve lugar no Céu para eles” (Ap 12, 7).
* O autor é teólogo e redator católico
(Autoriza-se reprodução do artigo com citação do autor.)
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