Artigo publicado no jornal Alagoas em Tempo, edição de 17 a 23 de abril/2017 | Ano 11 – Nº 775.
Marcos Antonio Fiorito *
Desde os mais remotos tempos, os homens se perdem por acreditar que o que pensam e defendem representa a verdade em absoluto. Isso se repete hoje, e de forma até patética, quando pensamos nas grandes e acaloradas discussões a que se dedicam muitos, resultando, até, em luta corporal.
Não raras vezes desentendimentos levaram povos a guerrearem entre si. Particularmente, as religiões nos impressionam com seu poder de transmitir princípios e valores morais sublimes, porém, frequentemente ficamos assombrados com aquilo que se convencionou chamar de fundamentalismo religioso. Seus adeptos interpretam tudo ao pé da letra e enxergam como verdade universal aquilo que entendem como parâmetro indiscutível para toda a humanidade.
Quando Maomé propôs a religião islâmica aos ismaelitas, não se limitou à Península Arábica, levou a religião de Alá para todo o Oriente Médio, porém não o fez pela pregação e de forma pacífica, mas sim pela força da cimitarra.
Isso se repetiu ao longo dos séculos, principalmente pelos turcos que, sucessores dos árabes, se encarregaram de levar o muçulmanismo até os confins da Ásia. O Império Turco, decadente e enfraquecido, parecia morrer no final do século XIX. Igualmente fraco parecia todo o mundo muçulmano, até que veio a descoberta de petróleo abundante no Oriente Médio e a criação da OPEP, fazendo o antigo inimigo ressurgir das cinzas e ganhar uma senhora sobrevida. Hoje, atônitos, assistimos o Ocidente seriamente ameaçado pelas hostes do Estado Islâmico, Al Qaeda e outras células terroristas.
O fundamentalismo religioso é cego, arrogante e presunçoso. Ele não admite outra verdade a não ser a do seu credo. Ele é, além do mais, limitante, já que o seguidor fanático sequer levanta ou admite a hipótese de que sua religião possa estar equivocada. E o que é mais digno de pena, é que para muitos a sua religião é verdadeira pelo simples fato de ter nascido nela. Ou seja, se ao invés de mórmon, tivesse nascido hinduísta, ele defenderia o hinduísmo da mesma forma, com unhas e dentes.
A Discovery Chanel apresenta em sua grade de programação uma série que reproduz fatos reais intitulada “Cultos Mortais”. Dois deles causam especial espanto, pois tratam de duas mulheres totalmente absortas pelas máximas de suas crenças, uma era adepta da Cientologia, a outra das Testemunhas de Jeová. As consequências disso em suas vidas foram gravíssimas. A primeira, apesar de todos os sinais e apelos dos psiquiatras, negou-se a tratar o filho esquizofrênico com especialistas, pois, segundo o fundador da Cientologia, os psiquiatras são perigosos, aproximam os pacientes do maligno. A segunda, obedecendo aos anciãos das Testemunhas de Jeová, divorciou-se de seu esposo por ter ousado desconfiar das máximas religiosas de sua esposa. Ela casou-se com outro adepto de sua religião, porém ele revelou-se um perigoso psicopata, chegando até mesmo a abusar sexualmente de sua enteada. Aterrorizada, ela apelou várias vezes aos anciãos, porém eles a acusaram de falso testemunho e a proibiram de se divorciar novamente. O fim das duas histórias é deveras trágico… Pode-se assistir aos episódios na íntegra pela internet: Cultos Mortais, temporada 2, episódios 1 e 2.
Lamentavelmente, não se pode evitar que todos sejam vítimas de tal equívoco, porém pode-se tirar, pelo menos, uma sábia lição que nos é dada pela Filosofia. De forma contrária ao que muita gente imagina, a Filosofia não pretende ser a aquisição da verdade, mas a sua busca contínua. A verdade é imensa e divina, de tal forma que nós, reles mortais, nunca a possuiremos em sua totalidade. Se fosse assim, não seríamos meros seres humanos, mas deuses.
* O autor é teólogo e escritor.
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